"Você já se imaginou sentar nesta esplanada e pagar bem pelo que vai comer e ter como vista estas pessoas?", questiona António de Sousa, proprietário do mítico café "Martinho da Arcada". Um cenário real, diga-se. Sentados numa das cadeiras do estabelecimento, lá se dá de caras com Amélia, a fazer as necessidades para dentro de um plástico, que depois coloca no caixote do lixo. "Já a vieram a buscar e a outros, mas regressam sempre. Este cenário afasta a clientela. Já fizemos um abaixo-assinado em Agosto por causa destes sem-abrigo e as autoridades não fazem nada", queixa-se o empresário.
Tendemos a querer longe o que nos pesa na consciência. É mais fácil fazer de conta que não se vê, que estas pessoas não existem, que são nada.
Este tipo de declarações reabilita o modelo da lepra e as práticas de exclusão e de exílio de outrora. Varrer as ruas, limpar o lixo, encarcerar a mendicidade e a pobreza, tratando-as como loucura. É este o nosso conceito de normalização. Erradicar a peste escondendo-a do alcance da nossa visão. Não importa se existe, desde que não a possamos ver, cheirar, tocar ou sentir.
Não importa se estas pessoas passam fome, se estão doentes, se têm frio...se estão sozinhas, vulneráveis ou fragilizadas...o que realmente importa é que incomodam o conforto de uma clientela que pode dar as boas vindas a um ano novo que só será novo para quem o puder pagar.
quarta-feira, dezembro 31, 2008
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